segunda-feira, 30 de março de 2009

Última Fase de Introdução

Bom, chega de introduções. Se quiserem saber mais, perguntem-me via caixa de comentários. Eu próprio vou dando indicações antes da anexação das histórias propriamente ditas, explicando certos contextos.
Este será o manual definitivo destes 15 anos de bandas-desenhadas. Não é um "best-of", porque não vou escolher nada e vou colocar tudo - o que também não é muito; é mais um "possible-of".
Permitam-me só mencionar mais esta coisa: sem falsas modéstias, as bandas-desenhadas não são grande coisa. Mesmo passando do papel para os bits. Julgo que beneficiaram do momento (em 1994 não havia tanta diversidade de meios e divulgação como há hoje), que as fez tornar mais originais. O nível de exigência dos meus leitores também nunca foi muito elevado, em meu entender - a maior parte era gente amiga e não estava a ler para me criticar.
Acima de tudo, estes papéis despertam alguma nostalgia (pelo menos para mim, como é óbvio) e são extremamente incorrectos do ponto de vista político (e doutros pontos de vista também). Eram "histórias" que seriam para maiores de 18 e eu nem sequer tinha 18 quando escrevi algumas delas.
Ou então eram somente pura parvoíce. Mas todos somos parvos na adolescência.
E ainda bem que sim.

"Fui Eu"

As pessoas liam, riam-se, achavam estranho e passavam o papel à pessoa intrigada ao lado. “Quem fez isto?”, perguntavam.
Notei-lhes alguma incredulidade. Ou porque não percebiam o que liam, ou porque a estupidez lhes passava ao lado, ou porque era simplesmente bizarro que fosse logo "aquele gajo" o autor.
Com o passar do tempo, porém, esperavam mais. O choque inicial acabava por se dissipar e tudo parecia fazer sentido.
Foi de "podia ser toda a gente menos tu" para "só podias ser tu".

Está explicado o nome do blogue.

Passado Destruído

De 1994 a 1996 escrevi muitas “histórias”, havia semanas em que fazia uma por dia.

Mas não tenho nenhuma delas. Dei-as todas. Gostavam, pediam-me e eu dava-as. Tão simples quanto isto.

Diziam-me, “tu és parvo; daqui a uns anos podia dar dinheiro… e quanto muito serviam-te de recordação”. Quanta sensatez. Não pela questão do dinheiro, que nunca pensei em vender nenhum papel e nem sei se haveria procura, mas sim pelo essencial que era manter uma recordação original.

Sim, eu fui e sou parvo.

Dei-as a quem as pedia, normalmente a quem pedia primeiro. A raparigas, sobretudo. Pensei que pudesse ficar mais próximo delas à conta das bandas-desenhadas. Era sempre uma forma de meter conversa e julgava que elas gostavam de tipos que fizessem umas coisas diferentes, assim a atirar para o engraçado. Mas nunca consegui o meu grande sonho: uma mega orgia com dezenas de gajas.

Ou seja, um fracasso rotundo: nem fiquei com o proveito da oferta, nem com a recordação de algumas belas “histórias”.

Sei de algumas pessoas que as possam ter, se é que ainda as têm. Mas elas já não as querem devolver, com legitimidade, ou não se lembram de onde as puseram. Também já não sei do paradeiro dessa gente. Acho que a maioria das bandas-desenhadas desapareceu irremediavelmente. O papel, infelizmente, é muito biodegradável.

A partir de 1996 comecei a ser mais cioso. Mas entre este acesso de consciência e a prática ainda se perderam algumas "histórias" pelo meio...
O facto é que passei a tratar o meu espólio com mais seriedade. Não muita, mas apenas com mais uns pinguinhos de seriedade. Por exemplo, comecei a registar tudo o que ia fazendo, algo inédito até então.

Estava na altura de pensar no futuro e no que meter no meu álbum de recordações. Afinal, as pessoas viam-me como “o gajo que fazia bandas-desenhadas”, queriam lá saber se eu sabia os nomes de todos os plantéis da Iª Divisão, que eu tivesse boas notas a Matemática ou que eu fosse um tipo extremamente atraente (a minha mãe sempre achou que sim).

Portanto, isto é a comemoração dos 15 anos em cuja primeira história visível, na verdade, só tem quase 12 anos. Não há problema: o outro clube do bairro do Futebol Benfica também comemorou 100 anos quando fez 95 e os Pearl Jam assinalam o 20º aniversário de "Ten" quando o álbum faz 18.

O que vocês verão aqui é o que escapou à delapidação voluntária do meu próprio património.

A Forma

As “histórias” foram sempre feitas ao 1º take. Não havia cá rascunhos – isto era o rascunho e o definitivo em simultâneo.
Portanto, erros ortográficos, sintácticos e semânticos poderão existir com alguma frequência.
Entre algumas frases e desenhos bem amanhados, também verão riscos, borrões e rabiscos a roçar o pré-primário.
Sempre escrito com esferográfica. Azul ou preta, era a que eu encontrava. Também fiz a lápis, num caso extremo.
Sempre num papel A5. Pautado ou quadriculado, tanto fazia. Uma vez apostei no A4 e não gostei. Muito grande. Intriguei alguma gente por conseguir escrever e desenhar tão pequeno.
Sempre mal feito. Este era o espírito – um desejo urgente de fazer algo com poucos recursos, um estilo desapaixonado, apostado no argumento e nas pequenas piadolas, no absurdo inspirado nos maiores delírios dos Monty Python, no extremar de situações, nas diabolizações adolescentes. O desenho era um auxiliar. Nunca apostei em desenvolvê-lo. Aquilo era o melhor de mim. Era o que eu sabia fazer sem truques nenhuns.

Não era objectivo que fizesse arte, apenas que desenvolvesse uma estética artística. Era um protótipo de banda-desenhada definitivo.
Sempre assim foi, nunca poderia ter sido de outra forma.

A minha impressão é que as pessoas julgavam que eu sabia desenhar melhor, apenas não me esforçava. De certa forma, era verdade: eu não me esforçava… mas também não sabia fazer melhor.

Zé Bastos

O Zé Bastos era eu. O Zé Bastos era a personagem que assumia o meu papel. O Zé Bastos era um clone declarado do Bart Simpson.
Zé Bastos foi o nome que me ocorreu. Não havia nenhuma razão especial.
Assinava as “histórias” com Zé Bastos e o pessoal gostou do nome.
Quis “matar” o Zé Bastos quando mudei de escola. Tanto a nível de aspecto como de nome. Quis sair das minhas próprias “histórias”. Mas o Zé Bastos já estava demasiado enraizado. Já me perguntavam por ele, por que ele não aparecia, que mal é que ele me tinha feito.
E então continuei com o Zé Bastos, pelo menos no nome e no aspecto. Apesar de tudo, distanciei-o de mim. O Zé Bastos começou a ser tudo aquilo que eu queria – de malandro a maníaco-depressivo, de muito sensato para extremamente obsceno, de herói a anti-herói, tudo cabia. Aquilo já não era apenas a minha representação, era muito mais do que isso. O Zé Bastos tornou-se tão abrangente quanto possível.
O certo é que o nome e o aspecto foi-me enjoando com o passar do tempo. Fui limitando a sua presença e acrescentando personagens diferentes com o passar do tempo – julgo que houve “histórias” do Zé Bastos sem que o próprio Zé Bastos aparecesse. Concretizei o meu desejo de retirar definitivamente de cena o Zé Bastos apenas em 1998. Mas isso contarei depois.

Mesmo com todas as diatribes que fez e que eu lhe fiz, o Zé Bastos ainda vive como a minha mais famosa criação. Há gente que não me liga nenhuma a não ser pelas “histórias do Zé Bastos”.
Revejo pessoas após anos e anos e elas ainda me perguntam pelo “tipo do cabelo espetado parecido com o Bart Simpson”.

O sacana tinha carisma. É o que eu acho.

Prestei-lhe a homenagem de o ressuscitar para o cabeçalho do blogue. Sei que as pessoas vão reconhecê-lo.

Os Primórdios

Foi mais ou menos nesta altura do ano que me revelei ao mundo enquanto um projecto de autor de banda-desenhada.
Era a Primavera de 1994 e as aulas estavam cada vez mais chatas.
A minha professora de Ciências queria lá saber o que eu estava a escrever. O cheiro do esperma ressequido e de toda aquela massa húmida de pêlos púbicos devia ser mais interessante. Ela colocava as mãos por debaixo da saia ou das calças, coçava-se por um momento e depois chegava as mãos ao nariz. E fazia-o com alguma frequência.

Eu pensei que tínhamos atingido um nível bastante elevado de confiança professor-aluno. Havia um notório à-vontade e um desejo mútuo de escape daquela aula. A partir daí, senti-me legitimado para dar largas às minhas próprias fantasias.
Menos sexuais e mais pseudo-artísticas.

O meu colega do lado gostou da primeira história.

Eu gostei que ele tivesse gostado. Foi o primeiro passo.

Comecei a fazê-las nas outras aulas, em casa, quando tinha tempo – e era muito, eu nem sequer saía à noite.

Entre 1994 e 1996 devo ter feito mais de 40, 50, 60 “histórias” – qualquer estimativa é imperfeita: só sei que fiz muitas, como em mais nenhuma altura da minha “carreira”. A maior parte eram tiras simples, uma folha A5 rasgada, escrita só de um lado, menos de 10 “quadradinhos”. Dava-lhes títulos simples e quando me faltavam os nomes intitulava as "histórias" com nomes de canções dos Nirvana, Smashing Pumpkins ou Soundgarden.
Foi uma época muito prolífera. Algumas coisas nem eram originais – ouvia uma anedota e passava-a para a forma de desenho. Como nem toda a gente conhecia essas anedotas, o sucesso foi crescendo.
Neste período, a audiência era apenas a minha turma. Depois passou a ser a minha turma e mais uns quantos. Tive de mudar de assuntos – é que a maioria das “histórias” mais alargadas incluíam caricaturas do pessoal da minha turma e muitas “private jokes”. Alguns já não percebiam.

A mudança de escola não matou as minhas bandas-desenhadas. Perguntavam-me “Então e tu, ainda fazes aquilo?”. OK, eu vou fazer, eu gostava de fazer, entretinha-me e integrava-me socialmente com aquele papel rabiscado. Mudei de paradigma: escrevi “histórias” que pudessem ser lidas por todos, tornando os argumentos e personagens mais abstractas, citando eventos e personagens conhecidas por todos.

Zé Bastos nasceu em 1994, mas só no final de 1995 adquiriu uma dimensão superior ao mero membro daquela turma.

domingo, 29 de março de 2009

Declaração de Interesses

Este blogue começa aqui e acaba quando acabar de digitalizar/ imortalizar as cerca de 30 “histórias” que ainda tenho comigo.
Mais objectivo que isto não podia ser.
Depois vai ser mais um blogue morto, um cemitério abandonado na World Wide Web. Mas a missão estará cumprida e esse é um sentimento reconfortante.

É bom saber que o fim está próximo. E, melhor ainda, que sou eu quem determina o ritmo com que lá vou chegar.

As Maravilhas Que Um Scanner Pode Fazer...

Em 1994 só tinha papel A5 e uma esferográfica. Gostava dos Simpsons. Possuía uma vasta colecção de bandas-desenhadas da Disney. O Kurt Cobain tinha acabado de morrer. O Sporting deliciava os amantes do desporto-rei com Balakov, Figo, Paulo Sousa e Juskowiak. Tinha uma professora de Matemática que era o nosso "sex-symbol", uma professora de História que pesava 200 quilos e uma professora de Ciências Naturais que gostava de cheirar fluidos vaginais enquanto nos julgava distraídos, em plena aula. Mas nós notávamos.

Este era o contexto.

Em 1994 comecei a fazer esboços das minha próprias bandas-desenhadas. E já passaram 15 anos.

Este é o meu auto-tributo.